terça-feira, 30 de junho de 2009

onde vamos parar?

Mamãe grita do quarto 'Eu não disse? É bem a décima vez que o Globo Repórter faz uma matéria sobre a obesidade. É, minha filha, a obesidade é o mal do século, eu digo faz tempo’. Certo. Até então, tudo o que ela havia me dito havia literalmente entrado por um ouvido e saído pelo outro. Eu me contentava em responder com ‘hm’ e ‘ok’. Mas diante desse comentário eu apenas fiquei calada. E não pense que foi porque eu já to pra lá de cansada de ouvir sobre comida sem agrotóxico, obesidade na adolescência, gordura trans, ou coisa do tipo (se bem que isso também procede). Não, eu não consegui responder a este comentário com um simples ‘é...’ porque não está certo.
(...)
Tem muita gente gorda no mundo. Tá. Mas e daí? Tem muita gente feia, nariguda, careca, baixinha, vesga... E ninguém diz nada. Então por que obesidade tem que ser esse problema todo? Usando as palavras da minha genitora ‘porque, meu bem, obesidade leva a morte’. Certo. Mas atropelamento e homicídio também levam. Em vez de ficar mandando a gente fechar a boca, Globo, faz uma matéria sobre a violência urbana e dá em cima dos políticos, pra que eles resolvam essa palhaçada. De que adianta pesar 49 kg e ser malhadérrima se eu vou ser sequestrada na próxima esquina? Nada, eu lhe digo, não adianta de nada. Não to dizendo, longe de mim, que todo mundo tem que ficar gordo até que a violência acabe (o mundo ia sair de órbita com a quantidade de gente ‘pesadinha’). Mas olha, que tem coisa mais importante do que a qualidade da alimentação isso tem.
(...)
Mas mesmo assim, esses acima ainda não foram os motivos pelos quais eu não consegui ignorar o comentário da minha mãe. Não mesmo. Foi uma coisa, acho que até pequena, que ela falou, que me fez pensar. Que me fez tirar a cara de dentro do livro de física elétrica e olhar pra parede pensando ‘ela realmente acredita nisso?’ ‘A obesidade é o mal do século’, foi isso. Agora pense bem.
(...)Eu não sei não. Mas eu tenho a impressão de que tem milhões de pessoas morrendo de fome na África. E de AIDS no mundo. E que o segundo remédio mais vendido no mundo (perdendo só pro viagra, mas isso é outro assunto...) é zantrax. Então é o seguinte, ser gordo é o de menos. Pra mim, o mundo tem muitos maus. Muitos mesmo. Mas o pior deles é a inversão de valores. Sim, pode discordar, mas pra mim, se as pessoas soubessem valorizar o que merece ser valorizado as coisas não estariam tão caóticas. Se o ser humano pudesse por um minuto tirar a cabeça de dentro da bunda e olhar pro mundo aí fora a gente não estaria nessa merda (bastante irônico, não?). E digo mais, se não esse, o pior mal do mundo é a solidão. Não to falando de momentos sozinho. Não, isso é saudável, e eu mesma cultivo-os sempre que posso. Mas aquela solidão verdadeira é terrível. Dá um nó no estômago, um pânico, um medo de deixar o mundo assim, sem ninguém, e ao mesmo tempo uma vontade de sumir. A solidão é arrasadora. Ela me mete medo.
(...)
É, foi basicamente por isso que quando minha mãe fez aquele infeliz input na nossa ‘conversa’ (mais um monólogo por parte dela que tudo) eu apenas me levantei e fui pra cozinha. Porque é mais fácil engulir e escrever que apresentar meus pontos de vista e arriscar ser levada para um spa. Mas olha só, diante de metade to que tá de errado ai fora, ser gordinho passa despercebido.
E viva a obesidade, minha gente.